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Ciência e Tecnologia

Brasil é líder em número de cirurgias para 'rejuvenescer' vagina

Entre as possibilidades para modificar a região estão tratamentos com laser, cirurgias plásticas e cosméticos

20 setembro 2017 - 11h14Por Globo

Não se trata de reconstrução de hímen. O tratamento estético da vez, que vem sendo chamado de rejuvenescimento íntimo, nem se preocupa com a película sempre atrelada à virgindade. Em termos de aparência, ele pode diminuir o monte pubiano, atuar na flacidez dos grandes lábios e clarear a região como um todo. De quebra, promete aumentar o prazer da mulher na relação sexual.

- Este tipo de procedimento era algo muito restrito às atrizes pornôs. Mas desde que o brazilian wax (depilação à brasileira) começou a fazer sucesso no mundo, a mulher começou a olhar mais para a própria vulva. Fora que hoje ela é jovem e sexualmente ativa por muito mais tempo e percebe que essa região também envelhece e revela a idade - afirma a ginecologista Viviane Monteiro, da clínica da All Clinik.

Por meio de um laser, a médica consegue estimular a produção de colágeno, promovendo a sustentação da pele e o aumento da vascularização local. Em resposta ao estímulo, acontece o estreitamento do canal vaginal, gerando mais atrito e sensibilidade durante o sexo.

Foi o que sentiu a médica Amanda, de 36 anos, que fez o rejuvenescimento após ter dois partos normais:

- Me dá mais prazer na relação. Esteticamente melhorou muito: tinha uma cicatriz do parto e flacidez. Depois do laser, a cor pareceu mais como era antes da gravidez - conta ela, que é bailarina nas horas vagas e procurou o tratamento porque sentia que a bexiga pesava durante a execução dos exercícios, molhando a calcinha.

Para a empresária Marcela, de 43 anos, casada há 25, o rejuvenescimento funciona como um "botox":

- Com a idade, você perde colágeno não só no rosto, mas em todo o corpo. Como consequência, você está rindo, e tem um pequena incontinência. Não podia gargalhar, pular. Isso aos 40 e pouco... De bônus, o tratamento deu um gás na relação: - Nunca exagerei na depilação. Sempre disse para a depiladora que não era para ser capa da "Playboy". O tratamento fez isso também, revelou minha vagina. Já na segunda sessão, meu marido ficou curioso, percebeu a diferença, ficou animado...

Quando o tratamento é estético (o laser também é usado para questões funcionais, como essas pequenas incontinências urinárias), pode ser associado a procedimentos como o preenchimento dos grandes lábios vaginais e os peelings superficiais, que fazem o clareamento da região.

- Em geral, é algo indolor, e são recomendadas de três a cinco sessões, com intervalos mensais, e uma anual, para manutenção. Já no dia seguinte, é possível voltar a praticar atividades físicas. Sexo só depois de uma semana - explica Viviane.

Além dos tratamentos com laser, em 2016, a cirurgia plástica vaginal correspondeu a 1,7% dos procedimentos realizados pelos cirurgiões plásticos no Brasil. Pode parecer pouco, mas no total, foram mais de 25 mil pacientes que se submeteram à técnica. Segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS), o Brasil é líder nesta cirurgia, realizando quase o dobro do que foi feito no país que mais faz plásticas no mundo, os Estados Unidos.

Segundo o médico Rodrigo Itocazo Rocha, regente do Capítulo de Cirurgia da Genitália e Intersexo da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, a busca por intervenções funcionais e estéticas começou forte nos últimos cinco anos, sendo que, anteriormente, o campo de atuação era muito restrito a deformidades congênitas e traumatrismos.

- A procura aumentou principalmente por parte das mulheres que tomam hormônio na musculação e que acabam tendo hipertrofia do clitóris, que fica muito proeminete e incomoda na relação, e por mulheres que passam por cirurgias bariátricas e acabam tendo sobra de pele na região pubiana - diz ele, que hoje estima que 37% das pacientes procuram as cirurgias na vulva por motivos apenas estéticos, 30 a 31% por questões funcionais e o último terço pela combinação das duas coisas.

No caso da cirurgia, que movimenta tecidos e tira excesso de pele, é indicado, de acordo com Rodrigo, repouso relativo por duas semanas:

- É uma região bastante vascularizada, que tende a inchar bastante. Neste caso, sexo só depois de 4 a 6 semanas.

NOVOS PADRÕES

Para a antropóloga Mirian Goldenberg, autora de "Por que os homens preferem as mulheres mais velhas?”, da editora Record, a procura por tratamentos do tipo reflete um pânico feminino diante do envelhecimento, mas também revela uma fonte de poder:

- No Brasil, o corpo, principalmente para as mulheres, é o verdadeiro capital, um lugar onde elas investem tempo, dinheiro, preocupação. Mas não é um corpo qualquer: é um corpo magro, jovem, bonito, em forma. Mesmo mulheres que estão em profissões que não precisam desse cuidado são culturalmente obrigadas a investir nisso.

Na visão da pesquisadora, a busca pelo melhor aspecto da vagina mostra ainda uma mudança cultural em relação à sexualidade feminina:

- A vagina era uma área invisível para as mulheres. Quando ela passou a exergar e pôde achar que não era bonita dentro deste modelo de corpo, passou a querer transformar, assim como ela pinta o cabelo. Por que ela vai descuidar de uma parte que também pode ficar mais bonita? - questiona Mirian, que acredita que as mulheres buscam mais a transformação para si do que para agradar aos parceiros: - Fiz uma pesquisa com mulheres que fizeram plástica, e a maioria dizia que fazia para si e não para o outro. Elas se sentem muito mais poderosas porque podem ter o corpo que sempre desejaram e, principalmente, podem fazer o que querem com o próprio corpo.


- Meu marido não é muito atento. Acho que eu senti mais do que ele a diferença em termos de sensibilidade - confirma Amanda.

Há, no entanto, quem defenda que, por trás da busca por esses procedimentos, estão padrões de beleza que oprimem o sexo feminino. Para encorajar mulheres a se olharem, se conhecerem e se gostarem, as designers Karen e Kelly se uniram em um projeto que cola desenhos e fotos de vaginas, numa estética lambe-lambe, pelos muros de São Paulo.

- A inspiração foi a personagem "Clódia" - de "Contos de Escárnio", da escritora Hilda Hilst - uma artista plástica obcecada por desenhar bucetas. Motivada pelo conto, me propus a também desenhar bucetas e não consegui, primeiro porque não tinha repertório nem referências de como criar essas representações, depois porque a simples ideia de desenhá-las me despertava sentimentos angustiantes, dentre eles vergonha e nojo - afirma Kelly.