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29/06/2018 17:00

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'Agressiva e impositiva': deputados federais de MS condenam laqueadura compulsória

Vontade da mulher e da família devem prevalecer, dizem parlamentares

Discussão sobre a laqueadura compulsória voltou à tona com mais força nos últimos dias, após surgir o caso de uma mulher no estado de São Paulo que foi submetida a esterilização, a princípio sem a conscientização devida e por ordem da Justiça. Para cinco dos oito deputados federais por MS, a medida é agressiva e impositiva e só a mulher e a família devem decidir por esse tipo de procedimento.

Para o deputado Elizeu Dionízio PSB, somente a família deve definir se uma mulher quer ou não passar pela esterilização. Ele rebate argumentos de defensores da proposta, dizendo que é preciso esterilizar pessoas viciadas em drogas pesadas e que já perderam o controle de suas vidas.

''É mais fácil tratar a consequência do que a causa? Primeiro devemos tratá-la do vício e depois ela decide se quer ter filhos ou não'', finalizou o pessebista.

Luiz Henrique Mandetta (DEM), que é médico, disse que já existe legislação sobre o planejamento familiar e que existe uma série de protocolos a serem respeitados. Ele considera um absurdo o Mnistério Público e a justiça paulista tomarem a decisão de esterilizar uma mulher, a princípio, por iniciativa própria.

O democrata diz que se fosse o médico em questão que fez a cirurgia na mulher no estado paulista, não teria realizado o procedimento, mesmo com ordem judicial.

''Ela não estava esclarecida o suficiente. Não havia ninguém da família, aquilo foi irresponsabilidade'', define o parlamentar, que ainda acrescentou que medidas como esterilização feminina ou vasectomia para os homens exigem longo processo de amadurecimento, tratamento psicológico e prazo para arrependimento.

Sobre o mesmo tema quem acompanha as críticas do tucano ao MP e à Justiça é o deputado Zeca do PT.

''Sou contra. Isso não é laqueadura compulsória, isso é autoritarismo do Ministério Público. A liberdade da mulher tem de prevalecer. MP não pode mandar na vida das pessoas, eles são um poço de autoritarismo, tem que cuidar dos seus próprios problemas como os supersalários'', criticou o petista.

''A opção é das pessoas, é direito de cada mulher [passar por esterilização]. Tão pensando que é Deus?'', finalizou Zeca.

Resende lamenta falta de centros de planejamento familiar. (Foto: André de Abreu)

Geraldo Resende PSDB, outro médico, também é contra por achar que as pessoas precisam se manifestar espontaneamente. ''As mulheres é que precisam buscar o planejamento familiar e um dos instrumentos é a laqueadura e não o contrário''.

O tucano destacou que a falta de centros de planejamento familiar é um problema a ser resolvido. ''Se falta esse tipo de atendimento em Dourados, que é uma cidade grande, imagina no interior desse Brasil tão grande'', refletiu o parlamentar. Ele completou dizendo que no caso de São Paulo a Justiça invadiu uma área de foro íntimo, mesmo que a pessoa em questão seja vulnerável.

O pedetista Dagoberto Nogueira pediu tempo para analisar a questão, já que não acompanhou o caso da mulher em São Paulo em detalhes. No entanto, adiantou que não gosta da intromissão do estado em uma situação onde a única decisão deve ser da mulher.

Questionado se a laqueadura compulsória poderia ser aplicada em mulheres de rua, viciadas em drogas e em situação de extrema vulnerabilidade, Nogueira disse que ''é muito perigoso apoiar laqueadura compulsória, seja em qualquer circunstância''.

Não conseguimos contato com os deputados Fábio Trad (PSD), Tereza Cristina (DEM) e Vander Loubet (PT).

Entenda o caso

Decisão judicial obrigou a Prefeitura de Mococa (SP) a fazer laqueadura em uma mulher dependente química de 36 anos, que está presa há 7 meses por tráfico de drogas, logo após ela dar à luz o oitavo filho, em Mogi Guaçu (SP). 

A administração municipal chegou a recorrer ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) em novembro do ano passado, mas a decisão que anulou a sentença só saiu no dia 23 de maio deste ano, três meses depois de o procedimento de esterilização ter sido feito. 

Segundo a assessoria de imprensa da Defensoria Pública, não houve intimação do órgão ou nomeação de advogado dativo para atuar em nome da mulher. "(...) tais circunstâncias estão sendo apuradas em detalhes, bem como eventuais medidas a serem tomadas", informou.

Ação do MP

A ação de obrigação de fazer de 29 de maio de 2017 é do promotor Frederico Liserre Barruffin. No processo, ele afirma que a mulher já é mãe de cinco filhos que já estiveram em abrigos da cidade.

"(...) Considerando que a mãe não teria condições de prover as necessidades básicas de seus rebentos, além de colocá-los, frequentemente, em potencial risco em razão do uso de álcool e outras drogas. Por tal razão, foi recomendada pelos equipamentos de saúde e de assistência social deste município a realização de laqueadura tubária da requerida como método contraceptivo", disse em um trecho.

Em outro trecho fala que a mulher demonstrou interesse em fazer a esterilização, mas também "demonstrou desinteresse ao não aderir aos tratamentos e ao descumprir as mais simples orientações dos equipamentos da rede protetiva".

Procedimento

Em 26 junho de 2017, a pedido do juiz Djalma Moreira Gomes Júnior, a mulher passou por uma entrevista com uma psicóloga judiciária, onde demonstrou interesse em fazer a cirurgia.

Ela alegou que já tinha dado início ao processo de laqueadura em outros momentos com a ajuda de rede de atendimento protetiva, mas não conseguiu concluir o processo que seria "demorado e complicado" e que perdia o interesse quando ficava sob efeito do álcool. Ela assinou uma certidão em que concordava passar pela cirurgia.

No dia seguinte, o juiz condenou o município a fazer o procedimento. Na decisão, ele citou artigos da Constituição Federal sobre direitos sociais à saúde e a reponsabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS) com a assistência integral à saúde.

Gravidez

Em 8 de agosto, o promotor comunicou ao juiz que a mulher não compareceu à consulta para dar início ao processo de laqueadura. O juiz então deu prazo de 48 horas para o cumprimento da decisão, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.

No dia 30 de agosto, a prefeitura comunicou à Justiça que a mulher estava grávida e não seria possível cumprir a determinação. 

No dia 21 de setembro de 2017, a prefeitura pediu para o MP intimar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para indicar um curador especial para a mulher, que por ser usuária de drogas seria incapaz. A administração municipal também pediu que o MP solicitasse uma avaliação física e psiquiátrica da mulher pelo Centro Atenção Psicosocial Álcool e Drogas (CAPS-AD). 

O promotor viu a medida como desnecessária já que o processo "apresenta elementos seguros e satisfatórios acerca do estado de saúde física e psíquica da requerida, à vista dos relatórios oriundos do CREAS, Departamento de Saúde, CAPS-AD e do setor social (assistente social) deste juízo - bem como do laudo do estudo psicológico realizado pelo setor técnico deste juízo" e diz que a prefeitura poderia providenciar os laudos sem intervenção do poder judiciário. 

No dia 7 de novembro, a prefeitura recorreu ao TJ-SP pedindo a extinção do processo. No mesmo dia, um ofício do Centro de Referência Especializado de Assistência Social informou que a mulher não comparecia ao CAPS-Ad desde o fim de agosto e que estava com infecção urinária, não aceitando ser internada para tratamento.

Três dias depois, a mulher foi presa por suspeita de tráfico de drogas na Vila Santa Rosa, em Mococa. Na ocasião, outras três pessoas também foram presas pelo mesmo crime.

Em março, a Penitenciária Feminina de Mogi Guaçu informou ao juiz que, após o parto do oitavo filho, a mulher foi submetida à cirurgia de laqueadura tubária na Maternidade da Santa Casa no dia 14 de fevereiro, atendendo ao pedido da Justiça.

Anulação

Em maio deste ano, o TJ-SP anulou a sentença do juiz. Um trecho da apelação diz que nenhuma pessoa poderá ser obrigada a se submeter a esterilização compulsória, uma vez que se trata de procedimento médico invasivo, que lesa a integridade física de forma irreversível, entretanto, o procedimento já havia sido feito. 

***matéria do G1

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