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terça, 19 de março de 2024 Campo Grande/MS
COLUNA

Decifrando

Marco Santos

Retrato de um País esquisito

Ainda não desisti, como muitos já o fizeram

04 dezembro 2017 - 06h44

Por exigências de minha profissão, conheci o Brasil todo. Nos últimos 45 dias, transitei  por algumas unidades da federação, em regiões geográficas diferentes.

Em todas, vi os sinais explícitos de como a crise está deixando marcas indeléveis no território e no próprio povo.

O Brasil, nas últimas três décadas, fez opções políticas completamente equivocadas e não adianta culpar 500 anos de História. O país, acreditou em propagandas, na criação de imagens de candidatos “salvadores da pátria”,  bem elaboradas por marqueteiros políticos, ou (às vezes até de forma combinada com a assertiva anterior)  na “idéia de que não havendo nada melhor, vai este mesmo”.  Em alguns estados, como o Rio de Janeiro, a leniência, o descaso  e a irresponsabilidade apressaram o caos.  

Os  resultados claros de um desastre anunciado aí estão. Não acredito ser necessário, nesta altura do descalabro, cansar os leitores com os números do desastre, diariamente explicitados em  várias mídias. Faço então, uma visão situacional ampla do que vi e percebi em minhas andanças.
Há um câncer corroendo o país. Os efeitos danosos estão sendo sentidos, especialmente pelas classes mais humildes que não encontra saúde, educação e segurança na medida das necessidades.  Os recursos necessários foram surrupiados por estruturas criminosas travestidas em  partidos políticos, como está bem claro nas investigações em curso. 

A Constituição é desrespeitada. É evidente  que nem todos são iguais perante a Lei.

O povo sofre e só reclama individualmente. Não age como um corpo patriótico. Não há coesão cívica. Quando entrevistado, diz que não tem nada. Quando novamente perguntado, após uma calamidade natural, por exemplo, afirma que perdeu tudo. Assisti ao diálogo entre duas  repositoras de estoque em um supermercado em que uma delas disse que naquele dia não almoçaria pois estava sem dinheiro. Talvez tivesse usado o vale refeições como meio de pagamento de dívida, penso eu. No entanto, no bolso, um celular 4G. Para mim, pareceu incoerente, mas...

O brasileiro é  capaz de manifestações agressivas  diante o fiasco do “Muralha” em uma partida do Flamengo, lotar um estádio com a vitória do Grêmio na Libertadores, mas, presentemente, não vai às ruas protestar pelo que está acontecendo com o país, especialmente a corrupção escancarada.
O maior perigo , imagino,  está no  desalento das pessoas com maior escolaridade. Estes tem a evidente percepção de algo vai muito mal e não vê perspectivas alentadoras. O que mais se ouve é a expressão de que “se pudesse iria embora do Brasil”. Muitos estão fazendo isso com destino a Portugal, Canadá, Austrália e, claro, EUA.

As evidências de completa desordem pública são notórias. 

Começam por salários de funcionários públicos que não são pagos, em Estados quebrados financeiramente, em inédita situação nos últimos 50 anos.
Comunidades depauperadas criam cinturões no entorno ou mesmo “clusters” nos quais o estado não detém o poder dentro das cidades. Logradouros públicos são ocupados por “cracolândias”. Pessoas vendendo os mais variados produtos, pedindo esmolas  ou exibindo malabarismos, nos semáforos, com o intuito de arrecadar alguns trocados,  são lugar comum e dão a dimensão da crise.  Diante da dimensão do desemprego, mudaram a forma de calcular os índices e estas atividades são consideradas “emprego informal”.  

Verifiquei escolas abandonadas e/ou em estado de miséria. Ambulantes  e traficantes amontoam – se nas proximidades. Algumas, fechadas, viraram “quartéis” de grupos de narcovarejo. Vi muitos hospitais públicos que parecem pardieiros, como se dizia antigamente, e com a lamentável frase escrita à mão no que parecem tiras de lençóis velhos “não temos Emergência”. 

Obras inacabadas, abandonadas, atrapalham o direito de ir e vir, todas “empreendidas” sob o mote de futuros “legados” dos megaeventos Jogos Panamericanos, Copa América de Futebol, Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas Rio 2016 são, atualmente, os “monumentos” mais emblemáticos da arquitetura idealizada e construída com a finalidade precípua de delinquir, de lesar a sociedade em seus recursos financeiros e em seus sonhos.

A propaganda dos “benefícios” advindos das efemérides acalentou os sonhos e produziu as fraudes. Os sinais de que este seria o resultado eram mais do que evidentes, mas o povo apostou e perdeu. O Brasil não precisava deles. Não eram as prioridades nacionais. Mas aconteceram e a foram a gota d’água para a instalação da crise.

A corrupção, palavra mais mencionada pelos brasileiros em pesquisas realizadas faz desaparecer, realmente, mais de R$ 200 bilhões por ano,  é o sangue que faz o câncer tomar todo o organismo nacional. E, importante não esquecer, ela é irmã gêmea da política. Muitos desses bilhões foram desviados pelos grupos no poder.

Crises nacionais, como a brasileira,  requerem lideranças fortes em valores e princípios para empreender os caminhos de solução. A Inglaterra, diante de II Guerra Mundial, encontrou em Churchil, um estupendo estadista, que a conduziu à vitória nos momentos mais dramáticos de sua história moderna.

Nós, brasileiros, temos cabrais, jucás, temers, padilhas, angorás, arnaldos, picianis, garotinhos, oliveiras e toda a caterva que os apóia e auxilia nas falcatruas. Que fazer com eles senão coloca – los na cadeia? 

O Brasil está preferindo que a solução para o caos instalado seja buscada pelos mesmos que o causaram.  Curioso este país.  Apostar que as mesmas Orcrim, as quais produziram o mal, possam achar o caminho da saída, a luz no fim do túnel, é, no mínimo, acreditar que os porcos podem cuidar do chiqueiro em evidente processo de autogestão.

A saída da “presidenta” era mais do que necessária. Era imperiosa. Mas aceitar que, devido aos “mecanismos democráticos republicanos” e aos “pesos e contrapesos” a sociedade tenha que aguardar que a situação seja resolvida pelos políticos  acusados na Lava Jato, é demais!

Chega a ser repugnante vê – los na televisão pregando medidas “dolorosas mas imprescindíveis” , como a reforma do sistema previdenciário,  sem que estudos e avaliações transparentes,  bem apurados e discutidos tenham sido feitos antes de serem votadas. Eles têm pressa e o povo também, mas o que se vê, concomitantemente, são ações para deter a Lava Jato e apressar a salvação de mandatos políticos putrefatos. 

As mentiras continuam nos programas políticos eleitorais transmitidos pela televisão, números são divulgados e, se contextualizados, põem às claras a farsa das melhoras. 

Estamos chegando ao final de mais um ano e não se pode mais falar de Brasil como um país de futuro, avalio. As bases para isso não estão sendo produzidas. A defasagem estratégica entre o mundo tecnológico, já projetado para o Séc XXI e que vem sendo construído em todos os continentes, dificilmente será superada pelo país. Não há estratégias, recursos e os cérebros nacionais estão indo trabalhar no exterior, onde são mais prestigiados  e, claro, mais bem apoiados e pagos. Não  existem líderes políticos entre a atual malta de corruptos que somente tem competência para o saque do erário. 

Enquanto isso, se dá ouvidos e cedem imagens para a mediocridade, a geração do fossos abissais entre classes, raças, gêneros, cor e ideologias espúrias às nossas origens , valores e princípios. Até arte toma rumos “esquisitos”. Talvez eu esteja obsoleto.

Acreditar que podemos esperar janeiro de 2019 para começar  a resolver o que está décadas atrasado é imaginar que o planeta vai parar de girar para o Brasil embarcar.

Está na hora de os bons se manifestarem antes que seja tarde.

Eu volto! Ainda não desisti, como muitos já o fizeram.