Se a extinção das antigas salas de cinema de Campo Grande traz saudade para alguns, para outros pode representar a promoção da capital de espectador a produtor. Aos 115 anos a capital sul-mato-grossense virou cenário, personagem, diretor e roteirista e está tendo sua história traduzida e eternizada pela sétima arte. A prova é a estimativa divulga pelo Colegiado Setorial de Audiovisual de Campo Grande, que mostra que em três anos 27 produções audiovisuais foram feitas na capital.
Os dados são recentes, de 2011 a 2013. O avanço pode ser explicado pela facilidade de acesso à tecnologia e a internet, mas também está ligado ao incentivo financeiro por parte do poder público como explica o membro do Colegiado Setorial de Audiovisual, Airton Raes. "Hoje temos muitas pessoas interessadas e os recursos públicos totais somam R$ 750 mil". Somente em 2014, o número de produções está próximo de superar a dos anos anteriores. Vinte e cinco filmes já foram lançados ou estão em fase de produção e finalização. Destes, oito produzidos de forma independente, onze com recursos estaduais e seis com recursos municipais.
Airton destaca que os gêneros de filmes são os mais diversos possíveis. "Temos desde filmes mais intelectuais até filmes de terror. Além da produção de muitos documentários", destaca. Destes, muitos tiveram destaque fora do estado e até do país, como “Ela veio me ver” de Essi Rafael; “Lados Dados”, de Breno Benetti; “Red Hookers”, de Larissa Anzoategui e “O Florista”, de Filipi Silveira, que foi selecionado para o Festival de Cannes do ano passado.
Curta-metragem 'Ela Veio Me Ver' de Essi Rafael Leal (Foto: divulgação)
Neste cenário está Marinete Pinheiro, que podemos dizer ser o reflexo da evolução da produção audiovisual na cidade. Profundamente ligada ao lado espectador dos campo-grandenses, já que pesquisou exatamente sobre as salas de cinema da Capital, estudo que resultou no livro 'Salas de Sonhos', produzido juntamente com Neide Fisher, Marinete teve a oportunidade de frequentar a Escula Internacional de Cine y Television, em Cuba, e passou de pesquisadora a cineasta.
Como boa campo-grandense, ela não se furtou em voltar para a terrinha para alavancar as produções locais. Atualmente, a cineasta está dirigindo e produzindo três filmes. São eles, o curtametragem de ficção 'Cinza', o documentário 'A Dama do Raqueado', e a animação 'O Mito Amarelo'. O segundo conta da história da compositora e cantora sertaneja Delinha e tem previsão de lançamento para outubro.
A ambição da cineasta é tanta que vai além dos limites permitidos pela capital. Marinete afirma que apesar da vontade, Campo Grande ainda carece de recursos para produções mais elaboradas e de qualidade. "A profissionalização é um grande desafio para gente, já que não existem cursos aqui. Mas acredito que houve muitos avanços nos últimos dez anos", afirma. A cineasta destaca a atuação do professor Doutor, Hélio Godoy, que tenta viabilizar a criação de um curso de Audiovisual, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
Os pioneiros - Mas apesar do novo fôlego, há quem já tentava fazer filme em terras de bois. De acordo com o livro 'Sala de Sonhos', de Marinete Pinheiro, o primeiro longa-metragem produzido na Capital, que se tem registro, é a produção 'Paralelos Trágicos', de 1965. "É considerado o primeiro filme, mas não existe documento, nem certificação", explica.
Além disto, a cineasta recorda os colegas que sempre produziram mesmo quando ainda não havia incentivos públicos regionais para o setor, como Candido Alberto da Fonseca, Alexandre Couto, Reynaldo Paes de Barros e Joel Pizzini.