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SOBREVIVENTES: em 2019, quase 100 mulheres viram a morte de perto nas mãos de homens

Entre elas, a ativista Bruna Oliveira que, após ser atropelada pelo ex-marido, conta como teve forças para seguir em frente

03 junho 2020 - 07h00Por Rayani Santa Cruz

A primeira edição do Mapa do Feminicídio de Mato Grosso do Sul mostra que entre 30 vítimas fatais, 98 mulheres conseguiram escapar da morte e da covardia de ex-companheiros, em 2019. Grande parte tentou matar por não aceitar o fim do relacionamento e por ciúmes. As informações são do Portal do MS.

São mulheres um tanto amedrontadas e com histórias tristes, mas de sobrevivência e volta por cima. Mato Grosso do Sul está na 3ª posição entre os estados com maiores índices de feminicídios, ficando atrás apenas do Acre e do Mato Grosso. 

Em 2019, o percentual de 16,6% das mortes ocorreram na Capital e 83,4% no interior. Desde o início do monitoramento dos casos de feminicídios no Estado, de 2015 a 2019, foram registrados 140 vítimas e 318 sobreviventes.

Crimes de feminicídios, via de regra, são cometidos mediante emprego de violência e crueldade, descaracterizando as partes femininas da vítima ou o que aquela mulher tinha de mais precioso na sua aparência.

Atropelada e socorro negado

Sobrevivente, a palestrante Bruna Oliveira dos Santos, de 30 anos, agora conta a sua história e tenta ajudar mulheres em situação de risco e violência. “Eu sempre acreditei que casamento era para sempre e lutava para manter meu relacionamento, até que um dia ele tentou me estrangular”, disse. 

Conforme o Portal, ela passou sete anos ao lado do companheiro, e por pouco não morreu. Ela contou que, na madrugada de 4 de novembro de 2017,  desistiu de viver quando se viu jogada na rua, após correr por mais de seis quadras e ser atropelada pelo agressor. 

Sem forças e com o corpo ensanguentado de tanto ser atacada, um dos braços pendia por causa da fratura exposta. “Eu não conseguia mais escapar dele. Então fechei os olhos e deitei”, recorda.

Ela conta que as pessoas que pararam no momento da agressão perguntaram ao homem o porquê da briga. “Eu pedia para elas me tirarem de lá, para chamarem a polícia. Ele aproveitou esse momento e fugiu, mas eu tinha medo dele (agressor) voltar. E aquelas pessoas só falaram ‘a gente não devia ter parado’, ‘é briga de marido e mulher’. Aí eles entraram no carro e foram embora”, lamenta.

Ela diz que, ao início, ele era um homem maravilhoso, e que depois passou a isolá-la. “Eu tenho lembranças de pensar ‘nossa que sorte de ter essa pessoa na minha vida’. Mas com o tempo comecei a notar comportamentos que não eram normais. Acabei me submetendo a coisas absurdas. Ele me isolou de todos. Fazia jogo psicológico e eu ia diminuindo. Sempre eram as escolhas dele, as prioridades dele”.

Depois de ter sobrevivido, Bruna viu seu agressor ser condenado pela Justiça a 10 anos e oito meses de prisão e virou ativista da causa. “Tive acompanhamento psicológico em que pude compreender o que acontecia. Me conheci com mulher, como pessoa. Eu entendi que o que aconteceu comigo, acontece todos os dias. Eu não queria ser mais uma. Parei, refleti e vi que eu podia fazer alguma coisa. Essa é uma luta diária para proteger outras mulheres”, explica.

Orientação

Ela orienta as mulheres que passam por violência a colocar tudo na balança. “A gente não pode confundir o cuidado com a posse. Quem cuida quer que você cresça, melhore como pessoa. Ela não quer te moldar à maneira dela. A gente precisa ter bastante claro o que é amor e o que é posse. A gente não pode confundir”.

(Atualmente Bruna trabalha com apoio a vítimas de violência. Foto: Portal do MS)

“Em relações abusivas os agressores isolam a vítima. Agressores são maridos, namorados, pessoas da família ou amigos. Normalmente o primeiro sinal é esse, isolamento. É algo que acontece porque agressor precisa dominar a vítima. É muito difícil convencer uma mulher que ela sofre violência. As pessoas no entorno dessa mulher precisam entender que ela vive relação doente e que ela precisa, aos seus passos, entender isso. E não é com julgamento, dizendo que essa mulher não tem vergonha, que ela não se ama, que ela gosta de apanhar. Não é esse o caminho”, esclarece.