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26/08/2024 10:48

Técnico de enfermagem é suspeito de fotografar partes íntimas de paciente sedada no RJ

Denúncia foi feita por um médico. Polícia Civil investiga o caso e funcionário deve ser afastado

A Polícia Civil do Rio de Janeiro (PCERJ), por meio da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá, investiga a denúncia feita por um médico do Hospital Federal Cardoso Fontes, na Zona Oeste do Rio, de que um técnico de enfermagem de 51 anos teria fotografado as partes íntimas de uma paciente, já na sala de cirurgia.

O caso aconteceu em 25 de julho e a denúncia foi realizada pelo médico urologista que faria o procedimento cirúrgico. O médico afirma ter visto o técnico com o celular na mão fotografando a mulher sem roupas.

Após o procedimento, o médico procurou a direção da unidade para denunciar o episódio. A vítima foi comunicada do fato 8 dias após a alta médica.

A paciente estava anestesiada antes de uma pieloplastia – um procedimento no canal que liga os rins à bexiga. Por isso, ela estava em posição de litomia, ou seja, com as pernas para cima.

O suspeito nega as acusações. Em depoimento à polícia, ele afirmou que pegou o telefone celular para “procurar sinal” e “já estava em ligação” quando foi acusado pelo médico. Ao g1, disse que estava com o aplicativo de foto para mandar uma selfie para enviar à esposa.

Paciente sedada

O portal G teve acesso a depoimentos e documentos do caso e ao relato do médico que denunciou o fato. O urologista contou que havia saído da sala de cirurgia e, ao voltar, viu, “atrás do vidro da porta, o técnico com o aparelho de celular na mão e a câmera do celular ligada fotografando a parte íntima da paciente que se encontrava exposta”.

O médico afirmou que o “evento foi visualizado com bastante clareza” e que, em seguida, perguntou ao técnico “se ele estava fotografando a paciente”. Segundo o urologista, o técnico “negou de forma enérgica”.

Ainda segundo o médico, mesmo após ter confrontado o técnico de enfermagem, o suspeito voltou a “disparar a foto da câmera outra vez”.

O urologista afirmou que finalizou a cirurgia e, após o procedimento, foi até seu chefe, relatou o fato e seguiu para a direção do hospital. Lá, registrou um relato de ocorrência e comunicou à chefia da enfermagem. No dia seguinte, 26 de agosto, a paciente recebeu alta médica e foi embora.

Três dias após o relato do médico, a Coordenação de Enfermagem do local fez uma comunicação interna para a Divisão de Enfermagem “para providências cabíveis” contra o suspeito.

No documento, a chefe destaca: “no ápice do fato, não tivemos a oportunidade de ver o celular do funcionário, pois ficamos perplexos com a atitude”.

No relatório, a coordenadora da enfermagem escreveu que estava indignada com o fato e escreveu que era “de bom tom para o serviço e a instituição não ter um profissional deste” trabalhando no Cardoso Fontes.

Após o relatório, houve uma reunião entre chefes da unidade de saúde que decidiram contar sobre o ocorrido para a vítima. Porém, o técnico não foi suspenso de suas atividades e segue trabalhando.

“Só soube chorar e me desesperar”, diz vítima

A vítima, que é agente de saúde, está abalada com a situação. Ao g1, ela relatou que se tratava no hospital havia anos – por conta de uma má formação genética – e aquela era a 3ª cirurgia que fazia.

A mulher critica o fato do técnico são ter sido demitido, bem como a demora da direção do hospital em avisá-la.

“Eu já tinha feito procedimentos lá e nunca tive problemas. Continuamos o acompanhamento e precisei retornar para fazer esse novo procedimento. Fui ao centro cirúrgico, tudo normal, correndo dentro do esperado e, chegando no centro cirúrgico, eles me falaram que eu iria dormir o processo inteiro. Todo o procedimento, até então, normal. Dormi o processo todo e no outro dia eu acordei”, relembra a mulher.

No dia seguinte, nenhum comentário sobre o ocorrido.

“Passei pela vistoria médica de manhã, onde ele me relatou que estava tudo bem, que tinha sido tudo dentro do normal. Não me passaram nenhum tipo de informação [sobre o caso]. Recebi alta e fui embora. Oito dias depois, de manhã, eu recebo uma ligação pedindo para ir ao hospital. Eu, meio atordoada e ainda não entendendo o porquê, pensei que fosse algo sério que estava acontecendo e que eu poderia estar em risco. Fui lá com a minha filha. Chegando lá fui recepcionada por várias pessoas, dentre elas médicas, enfermeiras, onde me foi passado o caso.”

A partir daí, a paciente conta que sua vida virou de cabeça para baixo. Mãe de quatro filhos e avó de uma neta de 2 anos, ela diz que só chora e só consegue dormir à base de remédios.

“Meu chão se abriu totalmente. [E eu fiquei] sem entender o porquê de aquilo estar acontecendo. […] Todo dia eu fico tentando buscar imagens na minha cabeça, tentando saber o porquê isso aconteceu”, relata a mulher.

“Na mesma hora, você não se sente uma vítima. Você se sente culpada pelo que aconteceu. Você se sente uma pessoa suja, inútil. Eu não tenho palavras para expressar o que sinto com essa situação.”

Após ser informada do episódio, a direção perguntou se a mulher queria ir para casa ou registrar um boletim de ocorrência. Abalada, ela diz que seguiu para a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá, onde ouviu da delegada que ela deveria procurar um advogado.

“Fui à delegacia, conversei com a delegada sobre tudo que eu havia ouvido. Ela me orientou a procurar os advogados para saber, daí para frente, o que poderia ser feito”, relata.

Busca e apreensão contra suspeito

A paciente, o médico e o técnico de enfermagem foram ouvidos no mesmo dia, em 2 de agosto.

No mesmo dia, a delegada Viviane da Costa Ferreira Pinto determinou que o caso fosse comunicado ao Conselho Regional de Enfermagem do Rio (Coren-RJ) para que houvesse uma investigação ética contra o servidor por parte da entidade.

O caso foi caracterizado e investigado pela Deam de Jacarepaguá por registro não autorizado de intimidade sexual – que é produzir, fotografar, filmar ou divulgar conteúdo com cenas íntimas, de nudez ou ato sexual sem autorização dos participantes, com a pena de detenção é de 6 meses a 1 ano, e multa.

No dia 8 de agosto, a delegada representou contra o profissional no Juizado Especial Criminal (Jecrim), um órgão do Judiciário para crimes de menor potencial ofensivo.

No relatório, a investigação pediu que a Justiça concedesse um mandado de busca e apreensão do celular do técnico de enfermagem e a quebra de sigilo dos dados dos materiais apreendidos.

Em nota, a Polícia Civil afirmou que “a autoridade policial representou pela busca e apreensão de dispositivo eletrônico do autor” e que o “caso foi enviado ao Poder Judiciário”.

No entanto, a Polícia Civil não informou se o mandado foi autorizado pela Justiça. A assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça afirmou que “não foi possível encontrar o processo na pesquisa feita a partir do nome indicado” e que “é provável que o caso esteja em fase de inquérito ou segredo de justiça”.

A defesa da agente de saúde entrou com uma petição no Jecrim pedindo que a juíza declinasse do caso e que ele fosse capitulado como estupro de vulnerável e que fosse para uma Vara Criminal.

Suspeito nega as acusações

O suspeito negou que tenha feito fotos da paciente. Afirmou que estava com o “telefone celular para procurar sinal e já estava em ligação” e que “ficou surpreso com a notícia, pois é instrumentador há 20 anos”.

Ainda ao g1, o técnico de enfermagem classificou a denúncia como “coisa ridícula, sem fundamento, esdrúxula” e disse que fez uma selfie para mandar para a própria mulher.

“Sou da área da saúde há 21 anos, e nunca ocorreu esse fato. Eu não entendi a história desse cara, que é sem fundamento. É uma coisa comum você pegar o aparelho para responder mensagens. Eu estava em contato com ela [esposa] e, quando fui pegar o telefone, fiz uma selfie para mostrar para ela: ‘Olha, mozão, estou trabalhando’. Naquele dia, mais 7 pessoas estavam na sala. Não pode um cidadão desse alegar uma coisa ridícula, sem fundamento e esdrúxula. Não sei se ele é frustrado, recalcado ou invejoso. Não sei”, disse.

O homem tem ao menos outras 4 anotações criminais:

  • abuso sexual conta adolescente de 16 anos, em 2009. Caso foi arquivado em maio de 2024 porque passou do prazo para investigação (prescrição);
  • ameaça e maus-tratos contra a mãe (em aberto);
  • estelionato e associação criminosa (em aberto);
  • apropriação indébita (em aberto).

Afastamento

Em nota, o Conselho Regional de Enfermagem (Coren-RJ) informou que foi notificado pela Comissão de Ética Institucional e pela Deam-Jacarepaguá. Segundo o órgão, foi aberta uma investigação na entidade, e todo o material produzido foi encaminhado à Câmara de Ética para o devido processamento, inclusive sobre uma possível suspensão cautelar do exercício de profissão.

O Coren-RJ afirmou que o profissional poderá ser advertido ou até ter a cassação do direito ao exercício profissional por um período de até 30 anos.

O Ministério da Saúde informou que o Departamento de Gestão Hospitalar (DGH) no Rio de Janeiro abrirá uma sindicância para apurar o caso e tomar as medidas cabíveis e que o servidor será desligado.

“O servidor temporário será desligado, conforme decisão desta sexta-feira (23/8) do Departamento de Gestão Hospitalar (DGH) da pasta, após avaliação interna realizada a partir do momento em que o caso veio à tona. As investigações internas e a colaboração com a Polícia Civil continuam. A vítima está recebendo todo o suporte necessário”, diz a nota.

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