Campo Grande

25/07/2025 11:00

Pai de santo 'some' e se cala sobre denúncia de tortura e ameaças em terreiro no Nhanhá (vídeo)

Vítimas foram forçadas a ingerir bebida alcoólica, ajoelhar por horas e queimar as mãos com pólvora durante ritual

25/07/2025 às 11:00 | Atualizado 25/07/2025 às 13:05 Felipe Dias
Mão das vítimas do pai de santo - Repórter top

O pai de santo de 40 anos, acusado de tortura e ameaças contra duas mulheres durante um ritual no Jardim Nhanhá, em Campo Grande, não foi encontrado pela reportagem, desde que o caso foi registrado. O líder espiritual, apontado pelas vítimas como autor das agressões, também não respondeu aos contatos feitos por telefone e mensagens.

Desde terça-feira (22), quando o caso ganhou repercussão após o registro da ocorrência na Depac (Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário), o pai de santo acusado é procurado para que possa se defender e dar sua versão dos fatos ocorridos. Apesar do espaço, não houve respostas.

As vítimas, de 21 e 44 anos, afirmam terem sido vítimas de tortura e ameaças durante um ritual espiritual realizado entre a noite da quarta-feira (16) e a madrugada de quinta-feira (17) retrasada. O responsável pelo local, o pai de santo de 40 anos, foi apontado como autor das agressões.

De acordo com o boletim de ocorrência registrado, as vítimas participavam de um trabalho espiritual tradicional da casa, quando o pai de santo anunciou que havia incorporado uma entidade chamada "João Mulambo". Segundo o relato, sete mulheres participavam do ritual, todas filhas de santo, e foram submetidas a uma série de práticas consideradas abusivas, sob ordens diretas do líder espiritual.

Conforme a denúncia, o pai de santo proibiu que as participantes se sentassem durante cerca de duas horas. Em seguida, rodou uma garrafa de cachaça e obrigou todas a ingerirem a bebida.

As vítimas afirmam que, embora algumas práticas sejam características do ritual, a imposição e o uso de violência física e psicológica não fazem parte da religião e foram além de qualquer limite espiritual. Duas das mulheres foram forçadas a permanecer de joelhos por mais de uma hora segurando velas acesas.

Em determinado momento, o pai de santo teria ameaçado todas as participantes dizendo que se alguma delas incorporasse uma entidade sem sua autorização, ele daria "cabeçadas até abrir a cabeça".

A denunciante mais velha relatou que, após sentir fortes dores de cabeça, pediu para sair, mas foi impedida sob a justificativa de que teria que ser "punida". Ela também afirmou que todas foram obrigadas a participar de um ritual em que se colocava pólvora na palma da mão e, em seguida, se acendia o material com um charuto.

Elas tiveram a mão queimada, mas não foram autorizadas a lavar o ferimento. Ainda conforme a denúncia, o pai de santo tentou jogar uísque sobre as queimaduras, prática que a denunciante recusou, mas outras participantes teriam sido submetidas à ação.

Abalada, a mulher contou que, após o ritual, conseguiu pegar a filha e ir embora do local. Ela afirma que todas as participantes foram submetidas à tortura sem justificativa e que o pai de santo, ao ser questionado, tentou legitimar os castigos como parte dos "fundamentos" da casa.

Ainda de acordo com o relato, o pai de santo alegou posteriormente que não se lembrava de nada, pois estaria incorporado durante o ritual. A denunciante frequenta o centro religioso há cerca de oito meses e revelou que essa foi a segunda vez em que um ritual de punição ocorreu no local. Na ocasião anterior, ela não havia participado por ainda estar em fase de desenvolvimento espiritual.

Após o episódio, a vítima buscou orientação com frequentadores de outros terreiros e ouviu de todos que as práticas às quais foi submetida não fazem parte das tradições da religião. O caso foi registrado como lesão corporal dolosa e ameaça.