há 1 semana
Prefeitura resgata R$ 2 milhões do Banco Master dias antes da prisão de banqueiro
Apesar do alívio, a análise técnica da carteira de investimentos de Angélica sugere que o risco pode não ter sido totalmente eliminado
Enquanto gestores de fundos de previdência de quatro municípios de Mato Grosso do Sul contabilizam os prejuízos com a liquidação extrajudicial do Banco Master, anunciada na terça-feira (18) pelo Banco Central, o município de Angélica (MS) teve a sorte de liquidar seus investimentos com o banco.
A deflagração da Operação "Compliance Zero" pela Polícia Federal, que prendeu o controlador do banco, Daniel Vorcaro, no Aeroporto de Guarulhos tentando fugir para Dubai, expôs um rombo bilionário e fraudes contábeis na instituição. No entanto, a Prefeitura de Angélica revela que o IPA (Instituto de Previdência de Angélica) conseguiu realizar o resgate integral de uma aplicação milionária apenas quatro dias úteis antes do colapso bancário.
De acordo com a prefeitura, em 12 de novembro o investimento foi totalmente resgatado, “sem qualquer prejuízo financeiro ao Instituto”. Em nota, a prefeitura explicou que todos os procedimentos seguiram os parâmetros definidos na política de investimentos e foram devidamente registrados em ata.
Assim como Campo Grande, São Gabriel, Jateí e Fátima do Sul, o RPPS de Angélica alocou uma parcela significativa de seus recursos em Letras Financeiras do Banco Master. Os relatórios de investimento de 2025 mostram uma posição consolidada em saldo de R$ 2.262.847,46, representando 4,88% da carteira total.
Resgate imediato
A prefeitura de Angélica afirmou que não controla o tipo de investimento no qual o fundo de previdência dos servidores irá aplicar o dinheiro da aposentadoria.
“O Instituto de Previdência de Angélica (IPA) é autarquia municipal dotada de personalidade jurídica própria, autonomia administrativa e financeira, e competência exclusiva para gerir os recursos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).
Assim, todas as decisões relacionadas a credenciamento de instituições financeiras, análises de investimentos, aplicações e resgates são tomadas exclusivamente no âmbito do IPA, mediante deliberação do Comitê de Investimentos, conforme determina a legislação previdenciária. Dessa forma, esclarece-se que a Prefeitura não participa, influencia, autoriza ou interfere nas escolhas de aplicação ou nas deliberações técnicas do IPA”, citou a nota.
O instituto solicitou e efetivou o resgate total dessa aplicação no dia 12 de novembro de 2025. A data chama atenção por sua proximidade com a operação da Polícia Federal, no dia 18.
Se o resgate não tivesse ocorrido, o valor estaria hoje bloqueado, sujeito às incertezas da massa falida e sem a cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), uma vez que Letras Financeiras não possuem essa garantia.
A manobra salvou os servidores de Angélica de um prejuízo direto imediato, um desfecho drasticamente diferente do vizinho São Gabriel do Oeste, que viu R$ 3,4 milhões "virarem pó" na mesma instituição.
Risco Oculto no Fundo Vértice
Apesar do alívio anunciado pela Prefeitura quanto à aplicação direta, a análise técnica da carteira de investimentos de Angélica sugere que o risco pode não ter sido totalmente eliminado.
Relatórios de investimentos de julho de 2025 mostram que, além da aplicação direta no banco, o IPA possuía cerca de R$ 1,8 milhão alocados no fundo "Vértice Fundo de Investimento Multimercado Crédito Privado". O fundo Vértice (anteriormente Polígono) tem histórico de incorporação de parcelas de outros fundos de direitos creditórios (FIDCs), como o "PSS Spectrum", geridos ou administrados por corretoras ligadas ao grupo econômico ou parceiros comerciais do Master. Relatórios de composição de carteira de fundos da família Vértice indicam alocação em cotas de FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) que, por sua vez, adquirem créditos originados pelo Banco Master ou suas subsidiárias (como o Credcesta).
A nota da prefeitura menciona especificamente o resgate da "aplicação financeira junto ao Banco Master S/A". Não está claro se esse movimento incluiu também o desinvestimento no fundo Vértice. O temor de especialistas é que fundos de "Crédito Privado" como este tenham em suas carteiras títulos de dívida do próprio Banco Master ou de empresas ligadas ao grupo econômico de Daniel Vorcaro. Se essa conexão existir, as cotas do fundo Vértice podem sofrer desvalorização abrupta ou congelamento para resgates, mantendo parte do patrimônio dos servidores de Angélica ainda na zona de perigo.
Operação “Compliance zero”
A prisão de Daniel Vorcaro lançou luz sobre o que a Polícia Federal classifica como uma organização criminosa sofisticada. A investigação aponta que o Banco Master operava uma "fábrica de fraudes", emitindo títulos de crédito sem lastro real (conhecidos como "fumaça") para inflar o balanço e enganar reguladores e investidores.
O esquema visava mascarar um rombo estimado em dezenas de bilhões de reais. A tentativa de venda do banco para o BRB (Banco de Brasília), vetada pelo Banco Central, foi o estopim para a ação policial. Para os Regimes Próprios de Previdência (RPPS) que compraram esses papéis "podres", a liquidação significa entrar em uma longa batalha judicial com pouca esperança de recuperação total.