Ainda que a Constituição Brasileira tenha assegurado a mais ampla liberdade de manifestação do pensamento (arts. 5º, inciso IV e 220), no que tange especificamente à liberdade de imprensa e de forma expressa, “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social”, os poderes, de alguma forma e sob os mais variados argumentos busca restringir informações, muitas vezes justificados pelo injustificável “segredo de justiça” que, não deveria caber para investigações sobre pessoas públicas, especialmente quando envolve denúncias de haverem assumido o poder por meio de ilicitudes.
Deixou expressa também que a liberdade de imprensa e a Democracia encontram-se em posição de reciprocidade; onde houver liberdade de imprensa, haverá espaço favorável para o exercício e a consolidação do regime democrático. Portanto, quando partes de informação são vazadas por pessoas que fazem parte das investigações, ou denúncias dos acusadores dão conta que existem tais e quais fatos contra o acusado, é salutar que a imprensa divulgue. Assim agindo, exerce sua função primeira que é informar.
Algumas acusações
Conforme noticiou órgão de imprensa da Capital sul-mato-grossense, “Ronam Edson Feitosa de Lima, ocupante de cargo comissionado na Prefeitura e pastor evangélico da igreja Assembleia de Deus Nova Aliança, estaria, em razão de sua função pública, solicitando valores a empresários em troca de supostos benefícios a serem concedidos pela Administração Pública Municipal, a exemplo da concessão de uso de terrenos, vantagens em processos licitatórios e nomeações em cargos comissionados; tal conduta criminosa seria avalizada por Gilmar Antunes Olarte, então vice-prefeito de Campo Grande e também pastor evangélico da Assembleia de Deus Nova Aliança”.
A acusação foi lançada pelo Procurador-Geral de Justiça de Mato Grosso do Sul, Humberto de Matos Brittes, e o promotor de Justiça Marcos Alex Vera de Oliveira, integrante do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), responsável pela investigação do que seria um dos maiores golpes da história política recente no Estado.
O que se tem
Isto é o que se tem, além das informações amplamente divulgadas de mandado de busca e apreensão na residência do prefeito Gilmar Olarte e da prisão de Ronam Feitosa efetuada em São Paulo. Isto consta do Procedimento Investigatório Criminal nº 02/2014/Gaeco, peça inquisitória que se encontra sob sigilo em razão de haver nela interceptação de comunicações telefônicas. Gilmar Olarte alegou que a operação desencadeada pelo Gaeco em sua residência, não passava de uma visita amigável e um convite para depor, mas foi desmentido em nota oficial emitida pelo próprio Grupo de Investigação.
Exageros
O que parece haver de exagero está na definição de valores e na quantidade de vereadores supostamente “comprados ou cooptados” pelo esquema, e na acusação de estupro de menores.
Não havia necessidade da compra dos 23 vereadores que votaram pela cassação do então prefeito Alcides Bernal, pelo simples motivo de que alguns votaram pela suas próprias consciências, outros pela manutenção do status quo do grupo que comandou os destinos de Campo Grande durante os últimos vinte anos, e que foram alijados do poder pelo voto popular.
Durante as investigações o Gaeco notificou em 22 de abril, três vereadores do PTdoB, Flávio César (vice-presidente da Câmara Municipal de Campo Grande), Eduardo Romero e Otávio Trad; o secretário municipal de Governo, Rodrigo Pimentel, articulador político do prefeito e Ismael Faustino, ex-assessor do ex-deputado estadual Rinaldo Modesto (PSDB).
Isso não significa que estes vereadores estivessem de alguma forma envolvidos com a suposta compra do voto pela cassação, uma vez que o partido ao qual pertencem sempre foi base de apoio cega ao ex-prefeito Nelsinho Trad, bem como os peemedebistas e outros.
Quem conta um conto aumenta um ponto
As supostas gravações onde assessores indicam os valores, não podem representar uma verdade sem sombra de dúvidas, pois estes tipos de acordo, caso tenham ocorrido, são feitos a quatro paredes. Se houve acordo político por cargos, é do jogo democrático e salutar se, e apenas se, se deram após os votos dados pela convicção de que havia motivos suficientemente fortes para a destituição do então prefeito.
Os valores supostamente cobrados pelos agiotas, conforme divulgado em outras mídias, não chegam perto de R$ 1 milhão, portanto bem distante de uma eventual dívida de R$ 23 milhões, valor necessário para cobrir os 23 votos que derrubaram Bernal.
Exageros e surpresa
Neste caso, parece haver um certo exagero nos comentários, ainda que pareça estranho que, se comprovada pelo Gaeco o uso de dinheiro de agiotas pelo atual prefeito ou por quem o conseguiu em seu sob ou sob seu aval, estes agiotas permaneçam em liberdade, uma vez que incorrem em crime contra a economia popular, ficando o sujeito ativo sujeito às penalidades do artigo 4º da Lei 1.521/51. Além disso, pode ainda ser configurado crime contra o Sistema Financeiro Nacional, posto que o agiota atua no mercado financeiro sem autorização pelo Banco Central para tanto.
A surpresa é em relação ao suposto vídeo de práticas de pedofilia por parte do atual prefeito e que teria sido encaminhado ao Gaeco para investigação. Se investigado e entregue à justiça, o crime de pedofilia, que com a reformulação do Código Penal, em 2009, diz que qualquer tipo de contato sexual com crianças e adolescentes, mesmo sem conjunção carnal, passou a ser considerado estupro e, portanto, qualificado como crime hediondo e, se a Lei 12.015, de 7 de agosto daquele ano, passou a tratar de forma mais rigorosa os agora chamados crimes contra a dignidade sexual, não seria plausível pensar que se permitiria a liberdade do acusado durante as investigações.
Desinformação
Esta instabilidade ocorre principalmente pela Censura imposta à divulgação de informações, ou a penalização aos órgãos de imprensa impostos pela justiça quando, mesmo tendo em seu poder informações confiáveis, não as pode divulgar.
Caso venha a se comprovar as denúncias contra membros da atual gestão municipal, cabe à justiça retirar do cargo aquele que assumiu funções de forma criminosa, penalizar os envolvidos. Mas no caso da cassação ter sido corroborada pela maioria dos vereadores, muda o nome do comandante sem que se altere seu exército.
No caso de comprovadas as denúncias de pedofilia e a existência do vídeo, mancha a própria justiça o fato de o criminoso permanecer à solta, pois representa um risco à sociedade.
Por tudo isso, é difícil acreditar que as acusações, conforme têm sido divulgadas, sejam de tamanha monta. Se forem verdadeiras as acusações, talvez não se perca a fé na justiça, mas fica comprovado que pela sua lentidão que beira a inoperância ela penaliza os cidadãos que deveria proteger.