A administração do tucano Reinaldo Azambuja teme que as investigações da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Enersul/Energisa acabem arranhando a imagem da concessionária que assumiu a distribuição de energia elétrica no Estado, pois a empresa poderia deixar de fazer investimentos em Mato Grosso do Sul provenientes de compromissos assumidos pela Energisa quando adquiriu as ações do grupo Rede.
“É uma cautela do governo. Ele (Reinaldo) não escondeu e nem pediu para que escondessem que ele não gostaria que atingisse a Energisa porque ela está entrando agora no Estado e faria investimentos que deixariam de serem feitos caso a CPI aprofundasse as investigações”, comentou o deputado Marquinhos Trad, do PMDB, um dos parlamentares que fazem parte da Comissão.
A interferência do Governo Estadual ficou evidente durante as indicações para o presidente da comissão. Neste ano, a Assembleia Legislativa quebrou a tradição e entregou o posto para Paulo Corrêa (PR), que indicou Beto Pereira (PDT) para a relatoria, ignorando o ‘acordo de cavalheiros’ que dá preferência ao proponente das investigações para conduzir os trabalhos, no caso, Marquinhos Trad.
Criada para investigar supostos desvios de R$ 700 milhões da Enersul, entre 2010 e 2015, a existência de uma folha de pagamento secreta que beneficiaria 35 pessoas físicas ou jurídicas, o pagamento de bonificações milionárias para ex-funcionários da empresa e possíveis desvios de recursos do Governo Federal, a CPI da Enersul/Energisa pode ainda naufragar na falta de interesse dos membros.
Na primeira reunião da comissão após a escolha do presidente e do relator dos trabalhos, os deputados decidiram apenas o titular da vice-presidência – Onevan de Matos (PSDB) – e travaram uma discussão sobre a necessidade ou não da contratação de assessoria terceirizada para analisar os documentos recolhidos para a CPI já que o grupo pode solicitar, gratuitamente, a contribuição de servidores da Assembleia Legislativa e do Tribunal de Contas.
Como destacou Pedro Kemp (PT), a discussão foi adiantada, pois o grupo ainda não solicitou nenhum documento, tendo à disposição apenas a conclusão do relatório elaborado pela PWC (PriceWaterHouse Coopers) contendo 24 páginas, e ainda não pode detalhar com precisão quais especialistas necessitará para dar apoio à comissão. Mesmo assim, uma lista de funcionários a serem contratados ou solicitados deve ser entregue na próxima reunião a ser realizada na terça-feira (14), a partir das 14h, no Plenarinho.
Justificando a lentidão da comissão, Beto Pereira alega que é preciso seguir todas as fases da CPI com bastante cautela para evitar injustiças com os envolvidos. Ele ressalta que o levantamento realizado pela PWC foi elaborado em 18 de março de 2014, mas nenhuma medida foi tomada desde então, talvez pela ausência de fatos concretos. Segundo ele, o texto informa que há “fumaça”, mas não garante que há fogo.
“Acredito que temos que fazer um cronograma e plano de trabalho da CPI que deve obedecer alguns critérios. A primeira fase é de coletar as informações, todas as informações necessárias para o embasamento de futuras convocações de pessoas para depor. O primeiro objetivo é juntar o máximo de documentos que pode subsidiar o trabalho da CPI”, informa.
De acordo com Beto, neste primeiro momento, a comissão deverá solicitar todos os documentos que basearam o relatório da PWC, em especial a lista de pagamento secreta, em que deverão ser explicitados os 35 beneficiários da folha e a quantia recebida por cada um deles, além de se inteirar sobre as conclusões da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) sobre o período de intervenção. “Vamos ir ao fundo”, garante.
Histórico
As investigações começaram após apuração da CVM (Comissão de Valores Imobiliários) que subcontratou a PWC – mesma empresa que descobriu o rombo da Petrobras – para fazer uma auditoria nos contratos da Cemat (Centrais Elétricas Mato-grossenses), e da Enersul.
As pesquisas foram conduzidas por oito auditores, entre analistas, gerentes de acompanhamento, superintendentes e contadores, que constataram a violação dos artigos 116, 117, 123, 124, 132, 133, 138, 139, 153, 154, 155, 156, 158, 176, 177, 245, 246, 265, 268 e 270, da Lei 6.404 de 1976, que trata das Sociedades por Ações.
Segundo o relatório, existem sinais de um possível desvio de R$ 700 milhões da Enersul, realizado pelo grupo Rede – posteriormente adquirido pela Energisa – que também mantinha folhas de pagamento paralelas, distribuindo “bonificações” para ex-funcionários.
Pelas investigações, a Enersul mantinha uma folha de pagamento paralela, cuja denominação interna era “folha confidencial”. Os pagamentos eram realizados para 35 pessoas físicas ou jurídicas, sem observar as políticas de remuneração da empresa ou qualquer avaliação objetiva de cumprimento de metas ou desempenho, por “mera deliberalidade”.
Não consta detalhamento dos valores utilizados ou o nome dos beneficiários deste grupo, mas a auditoria revela também que a empresa mantinha outro sistema denominado “gratificação extraordinária”, que repassava entre R$ 800 mil e R$ 2,5 milhões para ex-funcionários da Enersul como prêmio por “serviços prestados”.
A ausência de registros contábeis dos passivos referentes ao Programa de Universalização de Energia Elétrica do Governo Federal, também apresenta indícios de desvio na ordem de mais de R$ 200 milhões, de recursos destinados à Enersul e a Cemat.
Por fim, a CPI deve apurar possíveis fraudes na distribuição de dividendos e de juros sobre o capital próprio da empresa, em saques no valor de R$ 185,3 milhões para pagamento de empréstimos contratados pelo grupo Rede, sob o aval de Jorge Queiroz, e na subcontratação, através de direcionamento de licitações, das empresas Elucid Solutions S.A e da RBGRQM Participações Sociedade Anônima, da nora e do filho de Jorge, Regina Beatriz Gordinho Rusca e Jorge Queiroz de Moraes Junior.