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Saúde

10/08/2019 07:30

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Salvo de leucemia, advogado juntou dinheiro para dar casa a doadora

Com enredo de cinema, numa aula de amor ao próximo e gratidão, Elza, moradora de Rondônia, fez o mineiro Gabriel 'nascer de novo'

O que você faria para recompensar uma pessoa que, por acaso, um dia, entregasse a você um bilhete premiado de loteria? Isso não vai acontecer, mas é possível ocorrer coisa mais importante. Prova disso é a história que ligou Elza dos Santos Boaro a Gabriel Massote Pereira – ela doou a medula a ele e o manteve vivo, ele decidiu fazer uma vaquinha virtual e, nos próximos dias, dará uma casa para sua doadora.

Moradora da cidade de Ariquemes, em Rondônia, Elza duas vezes deixou as dificuldades financeiras de lado para sair de seu estado e salvar Gabriel. E daí que não tinha emprego, que andava deprimida após a morte do pai e não tinha sequer um cantinho próprio onde criar os dois filhos e morar com o marido.

Em 2011, então com 27 anos, o jovem advogado mineiro Gabriel, de Uberlândia, descobriu um câncer nos glóbulos brancos. Já naquele tempo leucemia não era uma condenação à morte. Fez o tratamento e parecia saudável, mas a doença voltou a aparecer em 2013. De forma mais agressiva, quase fatal.

Como o câncer já tomava 97% das células do paciente, a única solução era o transplante de medula óssea. E corre a família, desesperada, para torcer, rezar e fazer promessas para vir uma notícia positiva de um serviço que passou a fazer parte de muitas das conversas de Gabriel e dos parentes: o Redome (Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea), administrado pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca).

Gabriel ouviu dos médicos que era preciso ter paciência, apenas um a cada cem mil doadores seria compatível com seu organismo. Em outras palavras, estatisticamente era mais fácil ganhar na Loteria Federal, da Caixa Econômica, na qual se acerta uma aposta a cada 83 mil tentativas.

Tudo seria perfeito se a doadora não tivesse se mudado sem atualizar o cadastro no serviço. Sua única chance havia desaparecido. Elza, hoje com 39 anos, nasceu no Paraná, mas ainda criança foi morar em Rondônia. Em 2010, funcionários da área de saúde de Ariquemes montaram uma tenda na beira do rio e tentavam convencer a humilde população local sobre a importância de doar medula óssea.

Ela não sabia o que era direito, mas não pensou duas vezes para se inscrever. “Eu na época tinha meu pai de cama e sabia o quanto as pessoas sofrem quando estão doentes. Se eu um dia pudesse ajudar alguém…” Viu o pai morrer em seus braços em 2015, mas antes salvou a vida de um jovem do outro lado do país graças ao tubinho com 5 mililitros de sangue que deixou naquela tenda em 2010. “Ela, uma mulher simples, com menos estudos que eu e com uma série de dificuldades... qual razão tinha para ser doadora?”, questiona o advogado mineiro. “Eu não era doador", comenta.

Norte, Nordeste e Sudeste

Quando encontra duplas compatíveis, o Redome envia aos candidatos a doador uma carta avisando-os de que um paciente está esperando a medula. A correspondência de Elza realmente chegou, mas no endereço errado. “Eu já tinha me mudado dali, mas uma vizinha viu a carta na casa antiga e entregou para nós”, diz a hoje moradora de Ji-Paraná (RO). “Eu havia sonhado dias antes de ler a mensagem que eu tinha salvado um rapaz, que precisava de mim.”

Elza se deslocou de Rondônia ao Rio Grande do Norte em outubro de 2013 para fazer a doação. “Não dói, você toma uma injeção no umbigo e fica uns cinco dias internado até a medula se ‘desprender do sangue’. A retirada mesmo só acontece no quinto dia, num procedimento que dura de quatro a cinco horas. Tipo uma hemodiálise”, explica.

Gabriel recebeu a medula, mas, fragilizado, precisou de glóbulos brancos para resistir às complicações. E quem foi salvá-lo novamente? Em 14 de fevereiro  de 2014, Elza chegou em São Paulo para retirar uma quantidade suficiente de linfócitos. Mais quatro horas sentada, vendo o sangue sair de uma para entrar na outra veia.

Voltou satisfeita para casa, para seguir a vida com dificuldade. No ano passado, o marido viu a retroescavadeira (comprada com o dinheiro da casinha modesta que vendeu para investir na máquina) perder força até virar um monte de ferro velho. Acabou o único sustento do lar – moram de favor no fundo de uma igreja de Ji-Paraná. “Ninguém estava trabalhando, não tínhamos dinheiro para nada”, conta.

Por causa dela, ele se recuperou. Por causa dele, eles foram a programas de TV e viraram notícia porque Gabriel estava determinado a de alguma forma retribuir a lição de amor ao próximo de Elza. Criou a vaquinha virtual em maio com o objetivo de dar uma casa a sua doadora. Precisava de R$ 100 mil para isso.

“Encontramos uma casinha perto da mãe dela, por R$ 120 mil. Negociei com o proprietário e baixei para R$ 100 mil. Praticamente fechei negócio sem ter dinheiro”, admite Gabriel. “E fui para a internet tentar levantar o valor.”
A vaquinha se encerra no próximo dia 22 e tinha até a tarde desta sexta-feira (9) R$ 39 mil arrecadados. “Amigos meus e parentes passaram dinheiro direto para mim. Então, hoje, tenho cerca de 90 mil”, conta. “Agora, cara, eu vou comprar essa casa de qualquer jeito, nem que tenha que fazer um empréstimo.”

O pagamento da primeira parcela, de R$ 68 mil, será dado nos próximos dias. O restante, um mês depois. O advogado mineiro diz que se o valor arrecadado ultrapassar R$ 100 mil, manda cada centavo a Elza. ‘Ela precisa reformar o imóvel e mobiliar tudo. Não tem quase nada, infelizmente.”

Elza não vê a hora de se mudar e diz que, sem pressa, bem aos poucos vai ajeitando a nova moradia – com três quartos, bom espaço e de alvenaria. “Temos quatro latas de tinta e já ganhamos uma ou outra coisinha.” O marido voltou a ganhar alguma coisa consertando geladeiras e os dois filhos estão empregados. Ela também trabalha, mas não recebe nada por isso. Limpa a igreja em troca da moradia e faz serviços voluntários cuidando de idosos em sua cidade. “Não consigo ficar sem ajudar alguém”, justifica.

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