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Polícia

29/01/2024 07:00

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Família denuncia erro médico no atendimento de enfermeira morta após acidente na BR-060

Exames apontaram para lesão na alça intestinal da vítima e possível sangramento interno, mas paciente recebeu alta e morreu 11 horas depois

A família da enfermeira Nauany Novaes Barbosa dos Santos, 32 anos, denuncia possível erro médico no atendimento da vítima de acidente de trânsito, que morreu em casa cerca de 11 horas após alta hospitalar da Santa Casa de Campo Grande. O caso ocorreu em outubro de 2022 e o processo está em tramitação na 16ª Vara Cível, sob a responsabilidade do juiz Giuliano Máximo Martins.

Em 8 de outubro de 2022, a enfermeira seguia com a família - incluindo as duas filhas, à época com 1 ano e 12 anos, a mãe e o padrasto - em um Jeep Compass pela BR-060, com destino a Bonito. Em Sidrolândia, o veículo foi atingido pelo carro Fiat Uno de um casal, que invadiu a pista contrária.

Os idosos Pedro Carlos de Jesus e Maria Aparecida Bezerra de Jesus, que estavam no Fiat Uno, morreram no local do acidente. As vítimas do Jeep foram socorridas e encaminhadas para o Hospital de Sidrolândia. Nauany e a mãe, Lidiane Novaes Barbosa, que aparentavam lesões mais graves, foram encaminhadas em vaga zero para a Capital.

“Esse senhor perdeu a direção na curva e bateu de frente conosco. O carro dele partiu ao meio. Eles morreram na hora e a gente saiu andando do carro. Fomos socorridos e levados pro Hospital de Sidrolândia. O médico fez os primeiros atendimentos e eu e minha filha fomos de ambulância pra Santa Casa”, lembra Lidiane.

Ambas foram machucadas pelo cinto de segurança. “Constatou que eu tinha fraturado uma costela, quebrado o dedinho do pé. [...] Chegamos aqui na Santa Casa, no sábado, meio-dia, fiz a tomografia, fiquei até a noite internada e tive alta. Ela ficou até terça porque estava com uma micro hemorragia na barriga e o médico que atendeu, falou: ‘é jovem, isso aí é normal do acidente, da pancada, que o corpo iria absorver’”, continua.

Nauany permaneceu internada. Na segunda-feira, 10 de outubro de 2022, ela ainda estava com dor, mas recebeu alta por volta das 13h e foi para a casa da avó, no bairro Chácara Cachoeira. A mãe lembra que a filha reclamava de dores, mas a confiança no trabalho médico permaneceu, apesar de duas pessoas terem morrido no acidente.

“A gente achou que era normal por conta da batida, que foi muito forte, muito séria e que iria passar, ia melhorar, a gente confia nos médicos, na medicação e tudo mais. Quando deu 23h, minha mãe foi levar uma sopa e ela não aceitou. Minha mãe desceu e foi fazer um chá. Quando chegou com o chá, minha mãe percebeu que ela estava partindo, que ela estava indo embora”, conta Lidiane.

Nas fotos, Nauany com as filhas e a mãe

Carro de idosos partiu ao meio - Foto: Reprodução/TJMS

Sequência de erros

Os advogados Newley A. S. Amarilla e Rodrigo Tesser Pontes entraram com uma ação judicial contra a Santa Casa alegando uma sequência de erros médicos durante o atendimento da enfermeira. Eles consideram que o primeiro problema aconteceu logo no ingresso à unidade hospitalar, na medida em que não houve “classificação cinemática do trauma” – corriqueira em situações semelhantes –, o que certamente influenciou na posterior dinâmica de atendimento da paciente.

“A classificação da cinemática do trauma consiste na avaliação da gravidade do acidente, influenciando diretamente na identificação das lesões e, consequentemente, no respectivo tratamento, sendo procedimento fundamental ao adequado atendimento do paciente. Nesse cenário, conquanto tenha sido grave o acidente de trânsito que ensejou a internação de Nauany, foi ela classificada em risco “AMARELO”, que corresponde ao caso de gravidade moderada, com necessidade de atendimento médico, sem risco imediato”, explica a defesa.

A paciente, continuam os advogados, teria sido acompanhada apenas por médicos residentes, que não podem trabalhar sem supervisão. Isso contribuiu para possível falha na interpretação dos exames realizados em Nauany durante internação, uma vez que tomografia computadorizada indicou a possibilidade de lesão na alça intestinal da vítima.

Nas fotos, Nauany com as filhas e a mãe

Carro da família de Nauany - Foto: Reprodução/TJMS

Um segundo exame de imagem foi realizado apontando lesão local, possível trombose e sangramento interno. “Aliado aos exames de imagem, estão os indicativos físicos e sanguíneos da paciente, uma vez que ela apresentava ‘dor abdominal difusa com irradiação para coluna lombar bilateralmente’ e perda sanguínea traduzida pela redução do hematócrito e hemoglobina”, aponta documento da defesa.

A equipe médica concluiu pelo diagnóstico de “lesão esplênica grau 1 com pequena quantidade de líquido livre. Sem demais achados no exame”. No entanto, auditoria posterior informou que manual de referência internacional (Advanced Trauma Life Support – ATLS) aponta que “lesões abdominais e pélvicas não diagnosticadas continuam sendo uma causa de morte evitável”, além de que “a demora em reconhecer uma lesão intra-abdominal ou pélvica pode causar morte precoce por hemorragia ou morte tardia por lesão visceral”.

Nauany faleceu na madrugada de terça-feira, 11 horas após a alta. Segundo os advogados, exames físicos apontavam “abdômen globoso e doloroso à apalpação, além dos resultados dos exames de imagem e sanguíneo, que apontavam para situação preocupante”. O laudo de corpo de delito elaborado pelo Imol (Instituto de Medicina e Odontologia Legal) constatou como causa da morte “complicações sistêmicas do trauma contuso (choque hemorrágico intra-abdominal)”.

Nas fotos, Nauany com as filhas e a mãe

Bebê estava na cadeirinha e toda família usava cinto de segurança - Foto: Reprodução/TJMS

O que diz a Santa Casa?

O hospital alegou, no processo, que a paciente “recebeu atendimento imediato, por equipe médica assistencial especializada, composta por emergencista, especialista em cirurgia geral e neurocirurgia” e a definição de prioridade “amarela” refere-se à classificação de Manchester, versando sobre a necessidade de se estratificar os casos por níveis de prioridade na ordem de atendimento.

“No caso em tela, esta classificação foi protocolar e seguiu critérios técnicos. Além disso, o atendimento e a assistência prestada foram realizados em tempo adequado, razão por que a alegação de que a classificação de Manchester tenha desconsiderado a dinâmica do trauma e contribuído para a evolução do quadro não tem fundamentação técnica”, diz.

A Santa Casa também argumentou que Nauany esteve com supervisão de profissional qualificado durante o período de internação e tentou incluir o médico responsável pelo acompanhamento ao processo, o que foi negado diversas reiteradas vezes pela Justiça, uma vez que o acompanhamento foi realizado por diversos médicos.

“Os exames clínicos e complementares confirmaram o quadro de lesão esplênica com indicação de tratamento conservador, já que demonstraram a existência de pequena quantidade de líquido livre, situação está incompatível com sangramento significativo. Nesse sentido, o controle hemático realizado, que tem por finalidade justamente o acompanhamento de hematócrito e de hemoglobina para controle de eventual sangramento, teve resultados totalmente incompatíveis com hemorragia, aliás, muito pelo contrário, foram totalmente aceitáveis na situação de diluição por reposição volêmica com solução não hemática, como soro fisiológico. Em outras palavras, em nenhum momento os parâmetros de risco, com necessidade de preocupação e muito menos de transfusão, foram ultrapassados”, aponta a defesa do hospital.

A Santa Casa ainda disse “que a clínica é soberana sobre qualquer outro tipo de avaliação, e que a paciente se apresentava totalmente estável e com clínica incompatível com lesão abdominal significativa, uma vez que estava com o trânsito intestinal preservado, com boa ingestão de alimentos e eliminação de fezes normais, não apresentava vômitos e nenhum sinal de irritação peritoneal. Além disso, o controle clínico demonstrou paciente normotensa, normocardíaca, eupneica e afebril”.

Em resumo, a paciente esteve sempre sob cuidados especializados e foi submetida a todas as condutas exigidas com o quadro clínico que apresentou. “A evolução do quadro clínico com complicação como a que apresentou a paciente, por si só, não induz a conclusão de que ocorreu erro médico, dado que ela pode ocorrer mesmo com assistência tecnicamente adequada e compatível com o histórico da paciente, como presente caso”.

“Isso porque, um dano endovascular oculto pode evoluir com sangramento e/ou necrose, e isto não significa que houve erro assistencial ou que a clínica apresentada pela paciente no momento da alta não fosse compatível com a conduta tomada”, complementa a defesa, que recorre da responsabilidade sobre o caso.

Ao TopMídiaNews, a assessoria de imprensa da Santa Casa enviou a seguinte nota:

A classificação de risco da paciente L. N. B., assim como o atendimento médico de Urgência e Emergência, obedeceu, como sempre, critérios validados internacionalmente. O quadro clínico da paciente foi conduzido de acordo com o que se apresentava no momento da avaliação, onde a mesma manifestava fatores sem maior gravidade.

A Santa Casa de Campo Grande ressalta que preza pela qualidade e humanização do serviço prestado aos seus pacientes, e que está à disposição para prestar os esclarecimentos necessários à Justiça, uma vez que o caso já está sob análise judicial.

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