Criadas em 2016, as empresas Apollo Sports Solutions e Apollo Sports Capital detinham capital somado de R$ 11 mil até o meio do ano. Ainda assim, fizeram proposta pelos naming rights da Arena Corinthians e fecharam posteriormente um acordo para explorar durante três anos as costas da camisa do time paulista. De onde vem, portanto, o dinheiro das companhias? Há uma teia de relações que envolve o português Antônio Manuel de Carvalho Baptista Vieira, que consta como réu na operação Lava-Jato, citado pelo juiz Sergio Moro em esquema de lavagem de dinheiro com o doleiro Alberto Youssef.
No ano passado, antes mesmo de a empresa ter sido constituída oficialmente, executivos da Apollo procuraram o Corinthians e fizeram proposta pelos naming rights da arena situada em Itaquera, zona leste de São Paulo. Segundo o UOL Esporte apurou com fontes ligadas ao clube, a oferta girava em torno de R$ 400 milhões – valor almejado pela diretoria alvinegra – e envolvia exploração de produtos financeiros e do plano de sócios-torcedores do time de Parque São Jorge. Ainda de acordo com pessoas ligadas à equipe, foi o entusiasmo sobre essa negociação que levou o presidente Roberto de Andrade a dizer, pouco antes da conquista do título brasileiro de 2015, que o acordo era iminente – o contrato chegou a ser redigido, o que a empresa nega.
Como Apollo saltou de R$ 10 mil para R$ 121 mi em um dia
A Apollo Solutions é um fundo de investimentos cujo capital saltou de R$ 10 mil para R$ 121 milhões no dia 23 de junho de 2016. O aporte responsável por essa valorização foi feito com a inclusão de terrenos em Itanhaém (SP), fazendas em São Desidério (BA) e 50% das ações da empresa Café Bom Dia.
Os terrenos em Itanhaém são da empresa Marjorie do Brasil, propriedade de duas empresas offshores, Accra e Marjorie Overseas – ambas com sedes em paraísos fiscais. Seu representante no país? Antônio Manuel de Carvalho. Ele mesmo era o dono, por meio de outra empresa, de algumas fazendas em São Desidério.
O Café Bom Dia tem três sócios: dois da família Paiva, fundadora da marca, e uma empresa chamada Global Coffee Trading Company, com sede no exterior. De novo, há uma conexão com Antônio Manuel de Carvalho: em 2015, quando a companhia foi processada pelo Bicbanco em ação de R$ 2,9 milhões, o português foi listado como avalista e corréu.
Depois de ter negociado para patrocinar a Arena Corinthians, a Apollo fechou com o clube um contrato de três anos para explorar as costas da camisa alvinegra. A ideia do fundo para o espaço é funcionar como alavanca de faturamento para outras empresas e ter a parceria com a equipe entre as propriedades usadas nesse plano de fomento. E qual foi a primeira marca usada pela companhia no uniforme do time paulista? O Café Bom Dia.
As coincidências entre Apollo e Antônio Manuel continuam. O fundo tem três conselheiros gestores: além de Michael Gruen, diretor-presidente e rosto mais conhecido, constam Eduardo Rosner e Helenilton Pontes. Todos declaram o mesmo endereço como residência (rua Bandeira Paulista, número 600, conjunto 32). É o local em que funciona o escritório de advocacia José Silva, que representa o empresário português em defesa na Operação Lava-Jato.
Por que Antônio Manuel virou réu na Lava-Jato
Antônio Manuel de Carvalho foi denunciado em 2014 por lavagem de dinheiro. Executou transferências de dólar supostamente simuladas entre Portugal e o Brasil, juntamente com o doleiro Alberto Youssef, no valor de US$ 3,2 milhões. A suspeita do MPF (Ministério Público Federal) é que o dinheiro seria usado para pagamento de propina no exterior.
Na página da Justiça Federal do Paraná, Antônio Manuel consta como réu no processo. O UOL Esporte obteve a informação de que a denúncia contra o português estaria suspensa, à espera de mais provas, mas não é possível ter certeza porque o processo está em sigilo de justiça.
A reportagem procurou o escritório de advocacia José Silva para saber a versão de Antônio Manuel sobre sua relação com a Apollo. Entretanto, o advogado Eulo Corradi Júnior, membro da empresa, alegou confidencialidade de clientes para informar que não poderia falar sobre o fundo ou sobre o empresário. Apenas confirmou que o escritório participou da estruturação da Apollo e que defendeu Antônio Manuel.
Questionado por meio da assessoria, o presidente do Corinthians, Roberto Andrade, disse que desconhecia a participação do português em negócios relacionados à Apollo ou ao Café Bom Dia. Rechaçou também qualquer temor em relação à origem do dinheiro do fundo, que é regulado pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Na verdade, a empresa é registrada na junta comercial.
"A Apollo Sports Capital tem firmado contrato de patrocínio para apenas uma propriedade de uniforme com o Sport Club Corinthians Paulista, e não com a Arena Corinthians. Para esse contrato ser assinado, passou pelo crivo financeiro e jurídico do clube, assim como sempre acontece com todos os outros patrocinadores", informou o clube, que não comentou negociações entre empresa, time e o fundo da arena para compra dos naming rights.
Apollo diz ter comprado terrenos há dois anos
A explicação da Apollo para os ativos listados pela empresa em maio de 2016 terem relação com Antônio Manuel é que as propriedades foram compradas do empresário português há dois anos. Segundo o fundo, a identidade dele só aparece nos documentos por culpa da morosidade da burocracia.
"Não há nenhuma relação do senhor Antonio. Aparentemente, ele era o proprietário de algumas das propriedades que foram adquiridas por um investidor e usadas como garantias", contou Gruen. "Desconheço todos os investidores do fundo, mas posso dizer que ele não é um", completou.
O UOL Esporte obteve versões atualizadas das matrículas dos imóveis que formam o capital da Apollo, e todos estão no nome do português ou de empresas ligadas a ele. A reportagem requisitou documentos ou comprovantes da transferência de propriedade, mas o fundo afirmou que os dados são de cunho comercial e confidencial.
O dirigente ligado ao fundo também negou ter conhecimento sobre qualquer ligação entre Antônio Manuel e Café Bom Dia: "Meu trabalho é com o diretor-executivo da empresa, que se chama Sidney".
Em nota ao UOL Esporte, o fundo disse que "as ações do Café Bom Dia não fazem parte do capital social da Apollo. A Apollo, entre outras estratégias, adquire ativos imóveis para dar garantias em relações comerciais. O fato de os imóveis ainda estarem em nome do senhor Antônio deve-se à burocracia cartorial, mas todo o processo legal foi feito". Segundo o texto, a relação entre fundo e Café Bom Dia é apenas de cliente e fornecedor.
Diretor do Café Bom Dia nega que português seja sócio
Segundo Sidney Paiva, diretor-executivo do Café Bom Dia, Antônio Manuel foi listado como avalista da empresa apenas como decorrência de uma transação comercial. Ele negou que o português seja sócio da marca.
"O senhor Antônio é do mercado financeiro, e esse aval é apenas uma relação comercial como qualquer outra", relatou.
Questionado sobre a inclusão das cotas do Café Bom Dia no processo que aumentou o capital da Apollo, Sidney disse que "o contrato proposto tem uma parte fixa e uma de performance. A parte de performance pode ou não (dependendo dos interesses das empresas) ser em dinheiro em uma possível participação".
Oficialmente, o Café Bom Dia nega ter qualquer participação societária na Apollo.