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13/05/2016 13:50

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Eleição da OAB expõe ausência da mulher nos espaços de poder do Judiciário

Lídia Ribas estudou Direito na antiga Fucmat, hoje UCDB (Universidade Católica Dom Bosco). Além de advogada, ela é economista, e possui graduação em Formação de Professores e em Administração de Empresas pela UCDB. Depois, Lídia se especializou em Elaboração e Análise de Projetos de Desenvolvimento Regional pelo Centro de Treinamento Para o Desenvolvimento Econômico, IPEA-CENDEC. Especializou-se em Metodologia do Ensino Superior, pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e em Análise de Sistemas, pela Ctis Informática e Sistemas. Além de especialização em Direito Civil e Empresarial, pelas Faculdades Unidas Católicas de Mato Grosso.

E mais: Lídia é Mestre e Doutora em Direito do Estado pela PUC/SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ). Pós-doutorados? Ela tem três. Um na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, outro na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa e outro em Ciências Jurídicas e Sociais, na UMSA/IEAT (Universidade do Museo Social da Argentina - Instituto Educacional Almirante Tamandaré).

Esse currículo de tirar o fôlego, - e que não acaba aqui já que Lídia Ribas é professora do curso de Direito da UFMS, avaliadora dos cursos de Direito no Brasil para o MEC (Ministério da Educação), além de atuar como advogada emitindo pareceres e realizando consultorias -, parece não ser suficiente para que ela ocupe um cargo de desembargadora no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Ao menos é o que parece achar a OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil/ seccional Mato Grosso do Sul), quando excluiu da lista sêxtupla do Quinto Constitucional do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul Lídia Ribas e outras três mulheres inscritas. Nenhuma delas recebeu votação suficiente na Ordem para continuar disputando o processo.


Ano da mulher, sem mulheres

A OAB instituiu 2016 como o Ano da Mulher Advogada, que segue como linha de Ação, o Plano Nacional da Mulher Advogada. No Artigo 2 do provimento 164/2015, que instituiu o Plano se diz: “O Plano Nacional de que trata este Provimento, no fortalecimento dos direitos humanos da mulher, terá como diretrizes:


I - a educação jurídica; II - a defesa das prerrogativas das mulheres advogadas; III - a elaboração de propostas que apoiem a mulher no exercício da advocacia; IV - a implementação de condições diferenciadas nos serviços prestados pela Caixa de Assistência dos Advogados, que atendam a necessidades específicas da mulher advogada; V - a promoção de diálogo com as instituições, visando humanizar as estruturas judiciárias voltadas às advogadas; VI - a construção de uma pauta de apoio à mulher na sociedade, tendo como focos principais: a) a igualdade de gêneros e a participação das mulheres nos espaços de poder (...)”.

O que a ausência de mulheres na lista, além de poucas inscrições, mostra é que a) igualdade de gêneros e a participação das mulheres nos espaços de poder não é bem aceito no Judiciário Brasileiro.

“Tem havido  pouca ação proativa em relação a maior participação da mulher. Este ano a OAB federal, inclusive, implantou o ano da mulher, então se espera que a mulher possa ter seus espaços melhor distribuídos, porque o que acontece, como tudo, quando a gente fala em democracia, o que se espera é que haja uma maior participação efetiva”, explicou Lídia.

A professora explicou que, para além da desigualdade de gênero indicada pela ausência de mulheres no espaço de poder, a situação mostra uma democracia que não se concretizou em plenitude. “O que a gente viu na participação do Quinto é que houve um tratamento genérico em relação a questão, e depois é claro que isso não garante esse acesso mais democrático da mulher nessa política destacada”.

Dessa forma, a mulher parecer ainda continuar com uma participação simbólica, a exemplo da Deusa grega Têmis, símbolo do poder judiciário. Quanto se trata da participação real, no entanto, o número ainda é irrisório. Dos 89 ministros judiciários atualmente em exercício, por exemplo, só 16 são mulheres. São 18% de mulheres contra 82% de homens. Uma pesquisa da AMB (Associação de Magistrados Brasileiros) mostrou que até o final da década de 1960 apenas 2,3% dos magistrados eram mulheres e nos tribunais não havia nenhuma mulher. 

                  Estátua representando a Deusa grega Têmis (foto: reprodução)

Já no fim da década de 70 essa porcentagem subiu a 8%, e depois chegando a 14% nos anos 1980, e alcançou 22,4% em 2005. O Censo do Poder Judiciário de 2014, feito com informações de 2013, coletadas pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) motrou que são 64% dos magistrados homens, contra 36% de mulheres. Em Mato Grosso do Sul são 31 desembargadores no Tribunal de Justiça, apenas 2 são mulheres.


Por que é tão difícil a mulher chegar aos espaços de poder no Judiciário?

Além da ausência de implementação efetiva das políticas públicas dentro das próprias instituições, como explicou Lídia, um trecho do discurso da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie traz outro aspecto:

“Nós dizemos para as garotas, ‘você pode ter ambição, mas não muita. Você deve ser bem sucedida, mas não muito, caso contrário, ameaçará o homem’. Porque eu sou uma fêmea esperam que eu deseje me casar, esperam que eu faça as minhas próprias escolhas na vida, sempre tendo em mente que o casamento é o mais importante. O casamento pode ser uma fonte de alegria e amor e apoio mútuo, mas por que ensinamos às garotas a aspirar ao casamento e não ensinamos a mesma coisa aos meninos? Educamos as garotas a se verem como concorrentes, não por emprego ou por realizações, o que eu penso que pode ser uma coisa boa, mas sim pela atenção dos homens”.

É o que também pensa a advogada, professora e pesquisa Giselle Marques, uma das mulheres que criou um movimento de reação e repúdio a ausência de mulheres na lista sêxtupla. “A gente tem uma dificuldade das próprias mulheres. O gênero masculino gosta do poder, ele se dispõe a disputar o poder. E o gênero feminino em geral não, em geral a gente se vê assim ‘ah eu posso até ajudar e tudo, mas não quero cargo, não quero nada’”, explicou, indicando que as mulheres crescem em uma cultura que não as estimula a participar de espaços de poder.

Giselle pontuou como exemplo o fato da atual diretoria ter cumprido a quota de 30% de mulheres, e nenhuma delas fazer parte da diretoria executiva. “Então, realmente quem comanda não são mulheres. Então eu creio assim, que é necessário que as organizações, da sociedade civil organizada, que elas têm que assumir um papel, que é o de fomentar a participação. É o que a gente esperava da atual diretoria, ela poderia fomentar a participação de mulheres, tanto no pleito, dos 19 inscritos nós só tivemos 4 mulheres. Então assim, a OAB está fazendo ouvidos mouros a esse momento da pós-modernidade”, contou.


O esforço tem sido das mulheres

Lídia e Giselle também concordam que os poucos espaços conseguidos por mulheres, tanto no poder judiciário quando no legislativo e executivo, se devem à organização e esforço das próprias mulheres e não ao estímulo de políticas públicas.

“Nós temos inclusive menos mulheres no nosso Tribunal de Justiça que o próprio Mato Grosso. E tem havido realmente alguns pequenos avanços, pontuais, são esporádicos, e  não traduzem concretamente a própria evolução da mulher no que diz respeito aos espaços que ela conquista em caráter pessoal. Então precisa que seja dado uma institucionalidade maior a essas ações e a mulher não está recebendo por parte das instituições esse apoio necessário”, explicou Lídia.

“Tenho conseguido esses espaços, mas essas conquistas têm muito mais um caráter pessoal do que institucional. As instituições não contribuem de forma decisiva como é seu papel fazer, pra que isso se efetive”, complementou a professora. O que Lídia explicou, também exemplifica a ausência de mulheres com baixo poder aquisitivo ou de mulheres negras – duas parcelas com ainda mais dificuldade – nos espaços poder, já que esforços individuais são, na maioria das vezes, efetivados por condições financeiras, raciais e sociais.

                                        Lídia Ribas (foto: Geovanni Gomes)

“Quando você fala em feminismo, muitas vezes as próprias mulheres já dizem assim ‘ah eu não sou feminista’. Acha que é um termo pejorativo. E feminismo nada mais é do que defender o direito das mulheres. E têm que serem defendidos por que? Nós ainda ganhamos em média 40% a menos que os homens pra fazer o mesmo tipo de trabalho. Nós ainda ocupamos uma proporção ínfima”, afirmou Giselle.

Para a advogada, a distribuição igualitária de gênero nos espaços de poder do judiciário também é uma questão de cumprir a filosofia e os preceitos da própria Constituição Federal. A Constituição prevê a igualdade de gênero, e como Giselle explicou, é o documento magno que rege como e em que sentido devem agir as políticas públicas no Brasil.

“Os tribunais superiores começaram a entender isso, por isso que hoje você, por exemplo, se precisa de um medicamento que não tem no SUS, se você entrar com uma ação, você consegue uma liminar porque é papel do estado fazer com que a constituição seja cumprida. A constituição não é apenas um pedaço de papel, a constituição é uma lei viva e a OAB de MS está transformando a Constituição num pedaço de papel”, criticou.

                                           Giselle Marques (foto: André de Abreu)

Giselle e outras advogadas e advogados fazem parte de um movimento de repúdio ao processo do Quinto Constitucional que deve pede a anulação da lista sêxtupla, já suspensa por decisão da Justiça federal. O pedido foi pelo pela ABMCJ (Associação das Mulheres da Carreira Jurídica-MS), mas o movimento já tem a Renap (Rede nacional de advogados populares) e a Associação de advogados pela democracia como entidades parceiras.

"Mesmo tendo mulheres com gabarito, daquelas que se apresentaram e tiveram suas inscrições indeferidas, na verdade a OAB está querendo dizer o que? Que não tem nenhuma mulher com capacidade, com condições de integrar uma lista sêxtupla, então isso é algo que não podemos aceitar", concluiu Giselle Marques

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